Brasao TCE TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DO TOCANTINS
COORDENADORIA DE RECURSOS

   

1. Processo nº:1435/2019
2. Órgão de origem:PREFEITURA MUNICIPAL DE MIRACEMA DO TOCANTINS
3. Responsável(eis):MAGDA REGIA SILVA BORBA - CPF: 38742314100
4. Classe/Assunto: 1.RECURSO/1.RECURSO ORDINARIO - REF. AO PROC. Nº - 5884/2014 - INSPEÇÃO CONFORME RESOLUÇÃO 747_2014 REFERENTE AOS TERMOS DE PARCERIA 1,2, 3 E 4_2013: FIRMADO COM O INSTITUTO SÓCIO EDUCACIONAL SOLIDARIEDADE - ISES - EXERCÍCIO 2014.
5. Distribuição:4ª RELATORIA
6. Proc.Const.Autos:LILIAN ABI JAUDI BRANDAO LANG (OAB/TO Nº 1824)

7. ANÁLISE DE RECURSO nº 224/2019-COREC

1 – RELATÓRIO

Trata-se de recurso ordinário interposto por MAGDA RÉGIA SILVA BORBA e CALIXTO FERREIRA LIRA FILHO, por meio da advogada acima qualificada, em face da Resolução nº 595/2018, proferida pela Primeira Câmara deste Sodalício, a qual acolheu os Relatórios de Inspeção nº 07 e 08, ambos de 2015, realizada na Prefeitura Municipal de Miracema do Tocantins, motivada pela Resolução nº 747/2014, visando obter dados, documentos e apurar possíveis irregularidades na execução e nos pagamentos efetuados nos Termos de Parceria nº 2, 3 e 4 de 2013, celebrados entre o município de Miracema e o Instituto Sócio Educacional Solidariedade – ISES, municipalidade na qual os insurgentes figuraram, à época, como Prefeita e responsável pelo controle interno, impondo-lhes multas individuais no valor de R$ 26.000,00 (vinte e seis mil reais).

A irresignação volta-se, precipuamente, contra os itens 8.1 e 8.8, “j” e “k”, do decisum fustigado. Em suas razões recursais os recorrentes pleiteiam o conhecimento e provimento do presente recurso, de modo que a decisão proferida por esta Egrégia Corte seja reformada, a fim de se julgar legais os Termos de parceria nº 02 a 04/2013, com o consequente afastamento das multas que lhes foram cominadas. Subsidiariamente, rogam pela diminuição do valor das multas aplicadas, com a fixação de multa única no valor de R$ 1.000,00 (mil reais). Para tanto, sustentam, em suma, que: a) a irregularidade consistente na ausência de autorização legislativa para realização de concurso de projetos é considerada formalmente legal; b) os termos de parceria prescindem de autorização legislativa para serem celebrados; c) apesar de não descreverem a dotação orçamentária, os termos de parceria nº 2, 3 e 4, não deixaram de indicar a fonte de recurso; d) a ausência de conta bancária específica e movimentações para diversas contas bancárias deve ser considerada uma impropriedade formal; e) a ausência de extrato bancário de relatório da execução física e financeira dos termos de parceria não era da responsabilidade da primeira recorrente; f) o recolhimento da parte patronal do FGTS era do parceiro privado; g) a ausência de comprovação de serviços prestados por pessoa jurídica contratada pelo ISES é de inteira responsabilidade do parceiro privado; h) o termo de parceria nº 02/2013 teve acompanhamento por parte do parceiro público; i) não houve qualquer pagamento em duplicidade para servidor; j) eventual repasse do Fundo Municipal de Assistência ao ISES não pode ser imputado à primeira recorrente; k) a condenação por ausência de regulamento próprio contendo procedimentos para contratação de obras, serviços e para compras destoa da realidade, porquanto o concurso de projetos e respectivos termos de parceria são regidos pela Lei Federal nº 9.790/99 e pelo Decreto nº 3.100/99; l) o apontamento relativo à ausência de acompanhamento formal por parte do poder público, da execução do objeto dos termos de parcerias celebrados é repetição do item “ausência de acompanhamento da execução dos termos de parceria”, não podendo ser aplicada nova multa pelo mesmo fato; m) a condenação relativa à ausência de publicação em imprensa oficial do município de extrato de relatório de execução física e financeira não deve subsistir, porquanto lastreia-se no mesmo fato do apontamento consistente na “ausência de extrato de relatoria da execução física e financeira dos termos de parceria”.

Protocolizado o recurso na data de 08.02.2019, por meio do Despacho nº 202/2019, a Quarta Relatoria encaminhou o feito a esta Coordenadoria de Recursos para a devida análise, o que me proponho a fazer, doravante, precipuamente com esteio nas regras previstas na Lei Orgânica e no Regimento Interno deste Sodalício (RI, art. 194, §3º).

2 – FUNDAMENTAÇÃO

2.1 – Inovação recursal. Arguição de matérias preclusas.

Da análise perfunctória dos autos pertinentes a este processado, verifico que os recorrentes MAGDA RÉGIA SILVA BORBA e CALIXTO FERREIRA LIRA FILHO, quedaram-se inertes quanto ao exercício de seus direitos de defesa nos autos de inspeção nº 5884/2014, atraindo para si, via de consequência, o fenômeno processual da revelia. Embora revéis, os recorrentes pretendem, nesta via recursal, apresentar argumentos que omitiram por ocasião da primeira oportunidade que tiveram de se defender naquele processo.

Pois bem.

O fenômeno da revelia traz uma série de consequências processuais, dentre as quais temos: I) a presunção relativa de veracidade dos fatos alegados em desfavor do revel e a certeza do débito que lhe fora imputado (RI, art. 216); II) a fluência dos prazos a partir da data da publicação da decisão no órgão oficial, independentemente de intimação, para o revel que não tenha patrono constituído nos autos (CPC/15, art. 346 c/c art. 401, IV, do RITCE/TO); e III) a possibilidade do revel ingressar no feito, no estado em que se encontrar, sendo-lhe vedado, todavia, pleitear sobre matéria já preclusa (LOTCE/TO, art. 23, in fine). Esta terceira consequência, que, ressalte-se, possui expressa previsão legal na Lei Orgânica deste Sodalício, é a que julgo mais importante para o presente caso e que deve ditar os contornos desta análise.

Nesse tocante, cumpre trazer à baila que a Quarta Turma do C. Superior Tribunal de Justiça, na assentada de 06.11.2012, por ocasião do julgamento do REsp nº 1084745/MG, fixou o entendimento que, uma vez verificada a revelia, o revel fica impossibilitado de manifestar-se sobre o que a ele cabia ordinariamente alegar, podendo apenas arguir direito superveniente, matéria cognoscível de ofício ou assunto que por expressa previsão legal possa ser ventilado a qualquer tempo, além de ter preclusa a produção de prova quanto aos fatos sobre os quais recaíram a revelia (REsp 1084745/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, DJe 30/11/2012).

Assim, em vista da demonstrada impossibilidade de se ventilar matéria alcançada pela preclusão, é que o recurso do revel, no âmbito deste Sodalício, deve se limitar à arguição de temas cognoscíveis de ofício pelo julgador ou exclusivamente de direito, sendo-lhe vedado, portanto, levantar, em sede recursal, questões fáticas que deveriam ter sido opostas quando de sua citação nos autos de prestação de contas, auditoria ou inspeção etc. Nesse sentido, confira-se os seguintes precedentes que se coadunam com o art. 23 da LOTCE/TO e com o julgado acima referenciado:

“APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO C/ PEDIDO DE LIMINAR - RECURSO INTERPOSTO POR RÉU REVEL - PEDIDO DE REFORMA AO FUNDAMENTO DE ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL DA OBRIGAÇÃO - MATÉRIA FÁTICA - IMPOSSIBILIDADE DE ALEGAÇÃO EM APELAÇÃO - PRECLUSÃO - AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DA REVELIA - INEXISTÊNCIA DE ARGUIÇÃO DE MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA - RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. DECISÃO UNÂNIME.

1 - Não há óbices para a interposição de recurso por réu revel, visto que ele pode intervir no processo a qualquer tempo, recebendo-o no estado em que se encontra. 2 - Não pode o revel invocar matéria de defesa em sede de apelação senão aquelas de ordem pública. Operada a revelia com relação à matéria fática deduzida nos autos, ocorre à preclusão de sua discussão em grau recursal. 3 - Inviável a análise, pelo Tribunal de Justiça, de questões não analisadas em Primeira Instância. 4 - Em ações que envolvem direito patrimonial disponível, o Código de Processo Civil e o princípio da eventualidade impõem ao réu que alegue \"toda a matéria de defesa\" na contestação (art. 336, CPC/15), sob pena de, em assim não agindo, ser-lhe vedado suscitar na Instância seguinte aquilo que não pré-questionou oportunamente. (TJ/TO - Ap 0001675-78.2017.827.0000 Rel. JUIZ PEDRO NELSON DE M. COUTINHO-SUBST.DESA. JACQUELINE ADORNO, 3ª Turma, 1ª Câmara Cível, julgado em 26/07/2017).” (grifei)

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INTERDITO PROIBITÓRIO. RÉU REVEL. MATÉRIA FÁTICA ALEGADA NA APELAÇÃO. PRECLUSÃO. 1. Em grau de recurso, somente é permitido ao réu revel alegar matérias de ordem pública ou questões que podem ser conhecidas de ofício pelo juiz, sendo vedada a discussão de matéria fática que não foi ventilada no primeiro grau. 2. Recurso conhecido e improvido. (TJ/TO - AP 0015643-83.2014.827.0000, Rel. Desa. ÂNGELA PRUDENTE, 3ª Turma da 2ª Câmara Cível, julgado em 23/09/2015). (grifei)

A par destes entendimentos, concluo que a matéria meritória veiculada pelos recorrentes MAGDA RÉGIA SILVA BORBA e CALIXTO FERREIRA LIRA FILHO, em suas razões recursais, não merece acolhida, por versar sobre tema eminentemente fático, que deveria ter sido objeto de defesa no processo de inspeção nº 5884/2014. Assim, por não terem apresentado defesa naquele processo, embora devidamente citados para tanto, referida matéria, trazida apenas em sede recursal, caracteriza inovação recursal e encontra-se alcançada pelo instituto processual da preclusão, nos exatos termos da parte final do art. 23 da Lei Orgânica desta Corte.  

Com efeito, o que os recorrentes almejam, a rigor, é atribuir ao presente recurso ordinário os mesmos efeitos jurídicos das peças de defesa que deveriam ter apresentado no processo de inspeção nº 5884/2014, mas, embora devidamente citados para tanto, não o fizeram. Ademais, calha pôr em relevo que art. 1014 do NCPC, de aplicação subsidiária na espécie (RITCE/TO, art. 401, IV), permite aos recorrentes alegarem matéria fática anteriormente não explorada nos autos a quo, dês que devidamente se comprove que deixaram de fazê-lo por motivo de força maior, o que não ocorreu na espécie.

A tese que ora se sustenta, no sentido da impossibilidade de o revel deduzir em sede recursal matéria fática não deduzida nos autos a quo, face à preclusão, fora por mim explanada por ocasião da análise de recurso nº 60/2018, atinente ao Recurso Ordinário nº 10.681/2017, em caso que guarda estreita similitude ao que se tem em apreço. Importa enaltecer, neste passo, que referido entendimento recebera o beneplácito do Ministério Público de Contas deste Sodalício que, ao emitir o Parecer nº 1232/2018, acompanhou a linha de raciocínio desenvolvida por este Auditor de Controle Externo, cuja exposição ora se renova, nos seguintes termos:

“(...)

É cediço que não há óbices quanto a interposição de recurso por revel, visto que ele pode intervir no processo a qualquer tempo, recebendo-o no estado em que se encontra. Todavia, as questões aduzidas pela recorrente deveriam ter sido apresentadas em sede de Prestação de Contas de Ordenador, estando, neste momento, alcançadas pelos efeitos da preclusão (LOTCE/TO, art. 23, in fine). É inaceitável que o Recurso Ordinário se transforme em peça de defesa exordial, ampliando irregularmente os prazos para os responsáveis e/ou interessados apresentaram (sic) resposta acerca das questões suscitadas pelo Tribunal. Afinal, ao revel foi dada a oportunidade de oferecer defesa em tempo hábil e este não o fez.

(...)” (grifei)

Saliento, outrossim, que esta linha de intelecção recebera recente adesão pelo Corpo Especial de Auditores desta Corte de Contas, que por meio do Parecer nº 777/2019, coligido aos autos nº 6.513/2018, manifestou-se do seguinte modo:

“(...)

6.7. Pois bem, em que pese as alegações retro mencionadas, em concordância com a manifestação técnica exarada no bojo da análise de recurso nº 138/2019 (evento 8) se constata que os argumentos trazidos na presente peça recursal se mostraram insuficientes para alterar a decisão recorrida, mormente em razão da revelia reiterada da recorrente no processo n. 9670/2017 – anexo, alcançada, portanto pela preclusão.

(...)”

E de outra forma não poderia ser, mesmo porque a aceitação de argumentos e documentos apenas em sede recursal pelo revel, mormente no âmbito deste Sodalício, consubstanciaria patente ilegalidade, por inobservância do art. 23 da LOTCE/TO, dispositivo legal que o impede de pleitear sobre matéria já preclusa. Ademais, destaco que a inobservância da preclusão em sede processual é fator que, consoante a melhor doutrina[1], uma vez verificada, culmina na nulidade do processo, daí a importância da estrita observância do dispositivo legal em comento e da tratativa de casos como o da espécie, da forma proposta nesta análise, que, conforme demonstrado, já recebera a adesão do Corpo Especial de Auditores e do Ministério Público de Contas junto a este Tribunal.

Portanto, tem-se por cabalmente demonstrada a impossibilidade de acatamento da matéria de mérito trazida pelos recorrentes na presente irresignação, porquanto alcançada pela preclusão, na medida em que ostentam a situação jurídica de revéis nos autos (LOTCE/TO, art. 23, in fine).

3 - CONCLUSÃO

Ante o exposto, concluo no sentido de que o recurso em apreço pode ser conhecido, em razão do atendimento aos requisitos de sua de admissibilidade. No que tange ao mérito, concluo que o mesmo deve ser improvido, eis que os argumentos apresentados pelos recorrentes revéis referem-se a matéria de arguição ordinária que fora omitida em processo de inspeção, alcançada, portanto, pela preclusão, nos termos do art. 23 da Lei Orgânica desta Corte, dos precedentes jurisprudenciais supratranscritos e do hodierno entendimento do Corpo Especial de Auditores e do Ministério Público de Contas deste Sodalício.

É como me manifesto.

Encaminhem-se os autos ao Corpo Especial de Auditores.


[1] DIDER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Vol. 1: Introdução ao direito processual civil e processo de conhecimento. Salvador: juspodivm, 17ª ed., 2015, p. 429.

Tribunal de Contas do Estado do Tocantins, COORDENADORIA DE RECURSOS em Palmas, Capital do Estado, aos dias 03 do mês de junho de 2019.

Documento assinado eletronicamente por:
HUMBERTO LUIZ FALCAO COELHO JUNIOR, AUDITOR CONTROLE EXTERNO - CE, em 03/06/2019 às 14:19:58
, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006.
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